O segundo dia de Rio2C foi marcado por algumas das principais discussões políticas e mercadológicas do setor cultural na atualidade, além da presença de personalidades da música e da tv brasileira — como os cantores Gilberto Gil e Ivete Sangalo, os atores Tony Ramos, Adriana Esteves, Juliana Paes e Vladmir Brichta — e de executivos do Grupo Globo, YouTube, TikTok e Netflix.
Uma enorme fila se formou diante do GlobalStage, o maior palco do evento, para o aguardado painel ‘Do plim ao play: vamos juntos fazer acontecer?’, do Grupo Globo, que encerrou a programação desta quarta-feira. Fátima Bernardes comandou a apresentação e recebeu Amauri Soares, diretor executivo da TV Globo, e Erick Brêtas, diretor de produtos digitais e canais pagos do conglomerado, além de diversos talentos. Eles celebraram as 27 mil horas de conteúdo brasileiro inédito produzido pelo Grupo Globo e as produtoras parceiras, e anunciaram novidades da programação como a novela ‘Terra e Paixão’, as novas temporadas de ‘Pipoca da Ivete’, ‘The Voice’ e ‘The Voice Kids’, além de diversas séries e documentários para o Globoplay.
No painel ‘Deu match: Netflix, Brasil e mais de uma década de histórias’, a Netflix apresentou uma série de nomes de sua equipe, como os executivos Elisabetta Zenatti, Gilberto Toscano, Hana Vaisman, Aline Lourena e Elisa Chalfon. O time celebrou novidades, como o reality show ‘Ilhados com a Sogra’, apresentado por Fernanda Souza, a mestre de cerimônias da apresentação da plataforma.
Os desafios da regulação
A regulação do vídeo on demand (VoD) — ou seja, de serviços de streaming que vão do Globoplay ao YouTube — foi tema de diversas mesas, começando pela de abertura, no Global Stage, que recebeu dois dos novos secretários do Ministério da Cultura, Márcio Tavares dos Santos (Secretário-Executivo) e Marcos Souza (Secretário de Direitos Autorais e Intelectuais). “Temos um papel regulador entre as relações dos criadores com as grandes plataformas, que têm alcance global e precisam do Estado para ter uma mediação desse poder”, afirmou Tavares.
Seu colega de Ministério disse que a Secretaria do Audiovisual vai conduzir os trabalhos em torno da regulação do VoD e anteviu dificuldades na aprovação de um projeto de lei: “Passei os últimos cinco anos no Congresso, é um tema que levanta muitas discussões, não vai ser fácil tramitar. O segmento de criação e de produção do audiovisual vai ter de estar engajado fortemente, presente em Brasília toda semana pra fazer o seu lobby”, disse Marcos Souza.
Questionado pela mediadora, a jornalista Ana Paula Sousa, sobre a estratégia que o governo adotaria para aprovar a regulação do setor — há dois PLs que tratam do tema, além da possibilidade de edição de uma medida provisória — Tavares não descartou nenhuma hipótese. “A estratégia está sendo discutida. O que há de compromisso do governo é que vamos atuar firmemente para fazer a regulação do VoD. A gente pode e vai aproveitar os dois PLs, podemos dar continuidade a um deles ou adotar uma outra estratégia, conforme for a maior possibilidade de aprovar no Congresso”, afirmou o Secretário-Executivo do MinC.
Outro painel muito concorrido na manhã foi ‘Regulação do VoD – Como Ampliar a Presença do Conteúdo Brasileiro’, que lotou o Screening Room. Ele foi aberto pelo diretor da Ancine Tiago Mafra, que exibiu dados do mercado latino-americano, mostrando que o Brasil tem o maior número de serviços de VoD na região (59 plataformas), mas menos de 10% do conteúdo das plataformas são feitos por brasileiros.
“Na Europa, o debate não é mais do setor, é da sociedade”, afirmou Mafra. “O que se fala de VoD é semelhante ao debate que se teve na radiodifusão. Era ali que se formava o imaginário popular, que se via as culturas regionais do Brasil aparecendo. O debate precisa acordar a proeminência da produção independente, não é só cota.“
Sem Fronteiras
O assunto esteve presente também no painel ‘Produções Sem Fronteiras: O Audiovisual no Independente no Cenário Global’, mediada pelo cineasta Aly Muritiba, que reuniu Andréa Barata Ribeiro (O2 Filmes), Barbara Teixeira (Anonymous Content Brazil), Fabiano Gullane (Gullane) e Fernando Dias (Grifa Filmes). ‘A gente gera muita riqueza e muito conteúdo para as matrizes. O Brasil não pode ser apenas um gerador de receita. Precisamos exigir a discussão deste tema, da regulamentação. A importância da nossa identidade cultural está atrás da política pública’, ressaltou Fabiano Gullane.
Andréa Barata Ribeiro reiterou que o setor está vivendo uma nova retomada e dividiu um pouco a experiência em coproduções internacionais no audiovisual. Ela chamou a atenção para a importância que as leis de incentivo tiveram para a estruturação de toda a cadeia produtiva do mercado nas últimas décadas, assunto que também permeou o encontro de Gilberto Gil, ex-ministro da Cultura, com o cineasta Andrucha Waddington.
Eles celebraram 30 anos de parceria e 18 projetos bem-sucedidos, entre documentários, clipes, dvds e até séries para plataformas de streaming. Gil comentou sobre os novos tempos e das intensas mudanças tecnológicas que se refletiram no mercado cultural desde a época em que ele deixou o cargo. Ele se confessou fã das plataformas de streaming e Flora Gil – que mediou o encontro – disse que o cantor é fã ardoroso do humor de ‘Tapas e Beijos’, de novelas antigas, mas também alterna com documentários clássicos e filmes europeus. No final, Gil preparou uma surpresa, pegou seu violão e cantou ‘Tempo Rei’ para a plateia que lotou o auditório.
A música também foi o assunto que dominou a conversa de Lyor Cohen – eleito pela Billboard um dos 10 nomes mais poderosos da música global – com a empresária Eliane Dias e o músico e produtor Evandro Fióti. Impressionado com os talentos que conheceu no Brasil, Cohen disse que o mundo será um lugar musicalmente melhor conforme os brasileiros ganharem ainda mais o mercado e quando descobrirem a importância da cultura brasileira.
A programação teve ainda a conversa de Hugh Forrest, copresidente e chefe de programação do festival americano SWSW, no qual o Rio2C se inspirou, com a jornalista Sônia Bridi. “É muito bom estar aqui, adoro a energia deste evento”, disse Forrest. “Sinto-me honrado pelo Rio2C inspirar-se no que fazemos no SXSW.
O americano lembrou do início do festival de Austin (no Texas) em 1987, como um evento de música que despertava muita desconfiança nos potenciais apoiadores. “O gênio do empreendedor é pegar algo em que ninguém vê valor e acrescentar algo que traz valor. Foi o que fizemos com o SXSW”, disse Forrest.
Em 1994, o festival começou a acrescentar outros temas, como tecnologia, até chegar ao formato atual, que cobre assuntos variados como transporte e alimentação, passando por moda, ciência, audiovisual e inúmeros outros. “A raiz do nosso evento é a criatividade e a vontade de reunir pessoas criativas. Isso nos alinha com o Rio2C, que tem o mesmo objetivo.”