Interpretar a estudante Camila mudou para sempre a vida de Carolina Dieckmann. Quando começou a gravar ‘Laços de Família’, com 21 anos de idade, ela precisava lidar com a responsabilidade de protagonizar uma novela em horário nobre, interpretando uma personagem escrita especialmente para ela por Manoel Carlos. Como se não bastasse, foi seu primeiro trabalho após o nascimento do filho Davi e, além da angústia de se separar do bebê para trabalhar, tinha dúvidas se a carreira de atriz era realmente o que queria seguir como profissão. Até que Camila viveu momentos intensos ao enfrentar um câncer e transformou a vida de sua intérprete. “‘Laços de Família’ veio como um chamado para eu me reconectar com a profissão de uma maneira muito forte. E para mim foi definitivo. Foi ali que entendi o que é ser uma atriz. Será uma grande alegria rever a novela e tentar identificar os sentimentos que estão presentes na minha atuação. Vai ser muito interessante acompanhar essa trajetória”, acredita Carolina. Na entrevista abaixo, a atriz relembra o processo de construção da personagem, a convivência com o elenco, as lembranças das gravações – principalmente do momento em que a personagem teve a cabeça raspada, cena que entrou para rol dos momentos mais antológicos da televisão brasileira – e o isolamento social nos Estados Unidos.
Entrevista com Carolina Dieckmann
Quais sentimentos a notícia da exibição de ‘Laços de Família’ despertaram em você?
Muitos sentimentos bons. É uma novela que me traz diversas lembranças fortes, de um momento em que eu estava escolhendo essa profissão. Embora já tivesse feito alguns trabalhos como atriz, eu tinha acabado de ter o meu primeiro filho, estava cheia de dúvidas e questionamentos, tentando entender o que eu ia querer fazer dali em diante e ‘Laços de Família’ veio como um chamado para eu realmente me reconectar com a profissão de uma maneira muito forte. E para mim foi definitivo. Foi ali que eu entendi o que é ser uma atriz. Entendi o ofício, o tamanho da entrega, foi esse o trabalho que me apresentou à profissão como algo que eu estava escolhendo fazer. Até ali eu me sentia escolhida, porque tinha passado em testes, eu não tinha tanta consciência do que era a profissão. Será uma grande alegria rever a novela e tentar identificar os sentimentos que estão presentes na minha atuação. Vai ser muito interessante acompanhar essa trajetória.
Como foi o processo de construção da Camila, principalmente para o momento em que ela fica doente?
O processo de construção da Camila vai muito de encontro ao universo do Maneco (Manoel Carlos), a ambientação no Leblon que é muito forte nas novelas dele, e o universo de uma jovem criada nesse bairro nobre da Zona Sul do Rio, que estuda do exterior. Um universo muito particular que não fazia parte da minha vida e precisei entender. Eu fui criada em Santa Teresa, no Centro do Rio, em outro contexto, comecei a trabalhar muito cedo, enfim, a Camila era diferente de mim nesse sentido e com o universo ao redor muito distinto, muito particular, que é o da da Zona Sul carioca. Ela teve um amadurecimento durante a trama até o momento em que fica doente, é um personagem com um arco dramático muito forte, onde acontecem muitas situações, e ela vai se transformando significativamente. Ficou muito presente o amadurecimento da Camila e a diferença gritante de como ela começa e como termina a novela.
A quais fatores atribui o sucesso da novela e da sua personagem?
Eu acho que as novelas do Maneco sempre tiveram muito sucesso porque falam do cotidiano de uma maneira muito íntima, simples e fácil de identificar. Essa crônica do dia a dia é irresistível. E falando dessa novela especificamente, acho que o drama da doença da minha personagem de fato é muito forte, mas a abordagem da trama sobre uma mãe e uma filha que se apaixonam pela mesma pessoa era muito interessante, e as tramas paralelas, como a da Capitu (Giovanna Antonelli) e da Íris (Deborah Secco), também eram muito intensas e deliciosas de acompanhar.
Quais as principais lembranças que guarda do período de gravações?
O que ficou mais marcado na minha lembrança é que todo tempo que eu estava no ambiente de gravação alguma coisa estava acontecendo, porque muitas vezes esperamos bastante tempo para gravar. As lembranças que eu tenho de ‘Laços de Família’ são de um aproveitamento do tempo muito grande. Como eu deixava o meu filho em casa, eu queria que o tempo que eu ficasse fora fosse muito aproveitado. Então eu estudava muito, passava as cenas várias vezes, estudava sobre pessoas com câncer. Era muita novidade, muita responsabilidade e tinha um desejo muito grande de ocupar intimamente o meu tempo com coisas que fizessem sentido para mim.
A cena mais marcante para você foi realmente a que a Camila raspa a cabeça? Ou Tiveram outras que você guarda com mais carinho na memória?
A cena mais marcante com certeza é a que ela raspa a cabeça. Foi a cena que veio logo depois de uma cena também muito marcante, quando cortaram o meu cabelo por dentro para parecer que eu estava perdendo cabelo. Essas duas cenas foram um rito de passagem. Foi quando a personagem entrou de uma maneira física em mim, ali eu encontrei fisicamente com a Camila. Eu sinto que ela estava mais forte do que nunca, e isso passou para cena, não fui só eu que senti. Acho que todo mundo que vê a cena identifica que tem ali um encontro físico da personagem com a atriz.
Como era a relação e a troca com o elenco com quem você mais contracenava?
Minha relação com a Vera (Fischer) e o Giane (Reynaldo Gianecchini) era muito incrível. Com o Giane porque ele estava fazendo a primeira novela e tudo era novidade, e ele estava muito entregue e comprometido com tudo, era muito estudioso, e a Vera aquela atriz exuberante, linda e generosa demais. Tive uma troca muito intensa com os dois.
Como foi o retorno do público na época da novela? No início algumas pessoas resistiam à Camila por ter ficado com o namorado da mãe.
O começo da novela para mim foi muito impactante. As pessoas logo começaram a me odiar, e a internet estava ganhando muita força naquela época. Existiam sites de pessoas dizendo que odiavam a Camila e nas ruas brigavam comigo. Isso foi muito forte e depois que eu fiquei doente foi ainda mais forte por um outro lado. As pessoas olhavam para mim e me abraçavam, choravam, ainda mais quando fiquei careca. Elas vinham falar de pessoas da família que estavam com câncer, a troca nessa novela foi a mais intensa de todas as novelas que eu fiz.
O que mais te atraiu na personalidade controversa da Camila?
A Camila entra em um embate muito forte com a mãe por ter se apaixonado pelo namorado dela e tenta dar conta daquilo tudo, e depois vem a doença, que passa a ser a protagonista da vida dela. O que mais me atraiu na Camila foi essa dualidade de ser uma menina com tantos conflitos, aparentemente frágil, e que vai encontrando uma força interior enorme para enfrentar sua dor.
Como está sua vida nos Estados Unidos? Continua em isolamento social?
É o primeiro momento desde que comecei a passar algumas temporadas nos Estados Unidos que eu não sinto que estou fora do Brasil. Sigo firme no isolamento, então, não faz muita diferença onde estou. Estou em casa como todo mundo que pode estar e sinto que o grande aprendizado é reaprender a viver sob novas condições, e isso vai desde as coisas mais simples, como colocar uma máscara, lavar as mãos até a entender as necessidades reais que a gente tem. Quais são os desejos que temos e como isso tudo precisa ser modificado e aprimorado. Acho que o grande aprendizado é adaptar-se a uma realidade que talvez não seja tão passageira na humanidade. Estamos todos aprendendo muita coisa com tudo isso.
De volta a partir do dia 07 de setembro no ‘Vale a Pena Ver de Novo’, ‘Laços de Família’ é escrita por Manoel Carlos, com direção geral e de núcleo de Ricardo Waddington.